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O judeu no meio dos espinhos
Grimm Märchen

O judeu no meio dos espinhos - Contos de fadas dos Irmãos Grimm

Tempo de leitura para crianças: 14 min

Houve, uma vez, um homem muito rico, que tinha um criado zeloso e honesto, como não havia outro igual. Todas as manhãs, o criado, que se chamava Martinho, levantava-se primeiro e era o último a deitar-se; quando havia trabalho demasiadamente pesado, em que ninguém queria meter as mãos, era sempre ele quem o desempenhava com coragem. E nunca se queixava, estava sempre alegre e de bom humor. Terminado o primeiro ano de serviço, o amo nada lhe deu, pensando que, deste modo, economizaria bom dinheiro e Martinho não se iria embora, mas continuaria a trabalhar para ele. Martinho não disse nada, continuou a trabalhar como até aí e, após o término do segundo ano, quando o amo não lhe deu salário algum, também não disse nada. Ao cabo do terceiro ano, o amo, um pouco hesitante, meteu a mão no bolso mas, refletindo, retirou a mão vazia. Então o criado disse-lhe:

– Senhor, eu vos servi, honestamente, durante três anos; tende a bondade de dar-me agora o que me é devido; quero ir-me embora e conhecer um pouco o mundo. – Está bem, meu caro, – respondeu o sovina do patrão, – tu me serviste com grande zelo e fidelidade, portanto, quero recompensar-te generosamente. Tornou a meter a mão no bolso e deu-lhe três moedas novas em folha, contando uma a uma. – Aqui tens uma moeda para cada ano de serviço, – disse o sovina; – é um ótimo salário, como bem poucos te dariam igual. O bom Martinho, que em matéria de dinheiro não era lá muito entendido, guardou o seu capital pensando com seus botões: „Agora que tens os bolsos bem sortidos, por quê hás de te amofinar com trabalhos grosseiros?“

Despediu-se do amo e foi-se por montes e vales, expandindo a alegria a cantar e a dançar. Ao passar por um matagal, surgiu dele um anãozinho que o interpelou:

– Aonde vais, compadre folgozão? Pelo que vejo não tens muitos aborrecimentos! – Por que hei de estar triste? – respondeu Martinho, – tenho no bolso o salário de três anos de trabalho! – E a quanto se eleva o teu tesouro? – perguntou o anão. – A quanto? Nem mais nem menos do que a três moedas novas em folha. – Escuta aqui, – disse o anão, – eu sou um pobre homem indigente, dá-me as tuas três moedas. Eu já não tenho força para trabalhar; tu ainda és moço e forte e podes, facilmente, ganhar a vida. Martinho, que tinha bom coração, ficou com dó do anão e entregou-lhe as suas três lindas moedas novas, dizendo:

– Com a vontade de Deus, não me farão falta! – Como és tão caridoso, – disse então o anãozinho – concedo-te o que exprimires em três desejos, um para cada moeda. – Ah, tu és então um desses que pode assobiar azul! Pois bem, se assim tem de ser, em primeiro lugar, desejo uma espingarda com a qual poderei acertar em tudo quanto eu apontar; em segundo lugar, um violino que obrigue a dançar todos os que me ouvirem, e, em terceiro lugar, quando eu pedir qualquer coisa, ninguém possa recusar. – Terás tudo isso! – disse o anão. Depois foi procurar dentro da moita e, imaginem, lá estavam a espingarda e o violino à espera, como se encomendados. O anão entregou os objetos a Martinho, dizendo:

– Tudo o que pedires no mundo, jamais te será negado. – Coraçãozinho, que mais podes desejar? – disse o criado de si para si e continuou o caminho. Pouco depois, encontrou um judeu com uma barba muito comprida, parecendo um bode, que estava parado boquiaberto a ouvir cantar um pintassilgo pousado no topo de uma árvore. – Maravilha de Deus! – exclamou ele – um animalzinho tão pequenino com uma voz tão forte! Ah, se fosse meu! Se alguém pudesse botar-lhe sal no rabo! – Se é só o que desejas, – disse Martinho – posso satisfazer teu desejo. Apontou a espingarda para o pássaro e este caiu no meio do espinheiro. – Vai, tinhoso, – disse ao judeu, – vai buscar o passarinho! – Não me chameis de tinhoso, Senhoria, – disse o judeu – aí vem chegando um cachorro; vou apanhar depressa o passarinho, uma vez que o derrubastes. Pôs-se de gatinhas no chão e meteu-se por entre o espinheiro. Justamente quando chegou bem no meio dele, Martinho teve uma ideia divertida: pegou no violino e começou a tocar. Imediatamente o judeu levantou as pernas e pôs-se a saltar; quanto mais depressa Martinho tocava, mais velozmente o judeu pulava e saracoteava; os espinhos raspavam-lhe a roupa, arrancavam-lhe os fios da barba de bode e laceravam-lhe o pobre corpo contorcido. – Ai, tem piedade de mim! – gritava o judeu – Não toqueis mais esse maldito violino; parai com isso. Senhoria, não tenho vontade de dançar. Mas o criado não parava, pensando lá consigo. – Êste judeu esfolou tanta gente durante a sua vida, deixa que os espinhos o esfolem também. E pôs-se a tocar o violino cada vez mais depressa, fazendo o judeu pular sempre mais alto, até que a roupa dele ficou em farrapos e a cara escorrendo sangue. – Em nome de Deus, – gritava ele – darei a Vossa Senhoria o que quiser, contanto que pareis de tocar… Darei uma bolsa cheia de dinheiro… – Bem, se és tão pródigo, – disse Martinho, paro de tocar, mas deixa-me felicitar-te, na tua idade danças admiravelmente. – Depois pegou a bolsa e foi-se embora. O judeu ficou parado, seguindo-o com o olhar até quase perdê-lo de vista; então gritou com toda a força: – Miserável músico, arranhador de rebeca, hei de te pegar! Eu te perseguirei até perderes as solas dos sapatos; vagabundo! Para valeres um vintém era preciso que to metessem na boca! E continuou a vomitar todas as injúrias que sabia. Tendo, enfim, desabafado a raiva, tomou pelos atalhos e chegou primeiro que Martinho à cidade e correu à casa do Juiz. Caindo-lhe aos pés, disse-lhe:

– Ai de mim, senhor Juiz! Vede em que estado me deixou um patife sem Deus que, em plena estrada, me assaltou, roubando-me a bolsa cheia de dinheiro. Vede minha roupa em frangalhos, a cara, as mãos, escorrendo sangue de causar dó a uma pedra. O pouco dinheiro que trazia, as economias de toda a minha vida, tudo quanto possuo, ele roubou. Pelo amor de Deus, senhor Juiz, mandai levar esse homem para a prisão! – Foi um soldado com sua espada quem te reduziu assim? – perguntou o Juiz. – Deus me livre! – respondeu o judeu – ele não tinha nem um canivete, mas apenas uma espingarda a tiracolo e um violino; é fácil reconhecer esse malvado. O juiz mandou os soldados à procura de Martinho e estes logo o encontraram, pois vinha vindo calmamente pelo caminho; detiveram-no e encontraram com ele a bolsa cheia de dinheiro. Quando se apresentou perante o tribunal, onde se encontrou com o judeu que renovou a acusação, o bom criado disse:

– Não toquei nesse homem e, também, não lhe tirei à força o dinheiro; ele mesmo mo ofereceu, espontaneamente, para que parasse de tocar o violino, cujos sons lhe eram insuportáveis. – Justo Deus, – gritou o judeu – esse aí prega mentiras como se pegam moscas na parede. O juiz, também, não acreditou e disse:

– E‘ uma desculpa muito esfarrapada; nunca se viu um judeu entregar, voluntariamente, a bolsa. E condenou o bom criado à forca, por crime de rapina em plena estrada pública. E quando iam levando o condenado, o judeu ainda gritou, mostrando-lhe o punho fechado:

– Vagabundo! Tocador de meia tigela, agora vais ser recompensado como mereces. Martinho subiu, tranquilamente, a escada do patíbulo; ao chegar lá em cima, voltou-se para o juiz e disse-lhe:

– Antes de morrer, concedei-me um derradeiro pedido, sim? – Pois não, – disse o juiz, – contanto que me não peças para te poupar a vida. – Não peço a vida, – disse Martinho, – quero apenas tocar pela última vez o meu violino. Ouvindo tais palavras, o judeu soltou um grito de terror:

– Pelo amor de Deus, senhor Juiz, não lho permitais. Mas o juiz redarguiu:

– Por qué nfio devo permitir? Por qué devo negar- lhe esta última alegria? Tem direito a ela e pronto. Aliás, mesmo que o quisesse, não poderia negar nada a Martinho, por causa daquele dom que lhe fora concedido pelo anãozinho. – Ai, ai, – gritava o judeu – amarrai-me, amarrai-me bem forte! Martinho pegou no violino, afinou-o, e quando deu a primeira arcada todos os espectadores começaram a bambolear o corpo: o juiz, o escrivão, os oficiais de justiça, o judeu, o carrasco, todos enfim, os que estavam lá presentes. A corda caiu das mãos daquele que estava amarrando o judeu e, na segunda arcada, todos levantaram as perna, e o carrasco largou o criado e se pôs em posição de dança; na terceira arcada, todos, de um salto, começaram a dançar, tendo o juiz e o judeu na frente a saltar como danados. A multidão, também, saltava e dava cambalhotas. Jovens e velhos, gordos e magros, todos entravam na dança, até mesmo os cães se levantavam nas patas traseiras e dançavam como gente grande. Quanto mais o violinista tocava, mais depressa saltavam os dançarinos, empurrando-se uns aos outros e chocando as cabeças, tanto que, estando todos machucados, começaram a gritar lamentavelmente. O juiz, já quase sem fôlego, gritou como pôde:

– Eu te perdoo, te perdoo! Mas para de tocar! Martinho, achando que o divertimento durara o suficiente, pôs o violino a tiracolo e desceu a escada, vindo colocar-se defronte do judeu, que jazia estirado no chão, exausto e esfalfado. – Velhaco, vagabundo, confessa agora de onde provém a bolsa de dinheiro. Não mintas, senão pego outra vez no violino e recomeço a tocar. – Roubei-a, roubei-a! – gritou o judeu, – tu ganhaste-a honestamente. Diante disso, o juiz mandou enforcar o mau judeu como ladrão. E Martinho continuou a perambular, indo ao encontro de quem sabe lá quais aventuras!

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Informação para análise científica

Indicador
Valor
NúmeroKHM 110
TraduçõesES, PT, FI, HU, IT, JA, NL, PL, RU, TR, VI, ZH
Índice de legibilidade de acordo com Björnsson35.9
Flesch-Reading-Ease Índice31.7
Flesch–Kincaid Grade-Level12
Gunning Fog Índice15.4
Coleman–Liau Índice10.3
SMOG Índice12
Índice de legibilidade automatizado6.9
Número de Caracteres9.428
Número de Letras7.285
Número de Sentenças110
Número de Palavras1.643
Média de Palavras por frase14,94
Palavras com mais de 6 letras345
percentagem de palavras longas21%
Número de Sílabas3.106
Média de Sílabas por palavra1,89
Palavras com três sílabas406
Percentagem de palavras com três sílabas24.7%
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